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sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Ser escravo é melhor do que ser sem-terra?

Olavo de Carvalho, no True Outspeak de 7 de dezembro de 2009, aos 18 minutos:

Os sem-terra são uma criação da modernidade...da Revolução Francesa. Antes não tinha sem-terra porque todo o senhor de terras era obrigado a aceitar um camponês que viesse de outra terra e, se não sobrasse mais lugar nenhum para ninguém, tinha [sic] sempre as terras da Igreja, que era [sic] aproximadamente 30% da área total, que era de cultivo livre. Então, ... durante toda a história do Ocidente, não houve um sem-terra antes do advento da "bendita" Revolução Francesa... era o quadrado redondo...

Vejamos o que diz Jacques le Goff em A Civilização do Ocidente Medieval, páginas 21 e 22, sobre o séc. V:

Os camponeses viram-se obrigados a se colocar sob dependência cada vez maior dos grandes proprietários, estes passaram também a ser chefes de grupos armados, e a situação do colono tornava-se cada vez mais próxima da do escravo. Algumas vezes a miséria camponesa transforma-se em jacquerie [Revolta camponesa ocorrida na França em 1358, cuja violência e alcance levou a que fosse tomada como o  modelo de rebelião popular], ...cuja revolta era endêmica nos séculos IV e V.
Página 50:

... Os grandes apropriaram-se do poder econômico, a terra, e, a partir desta base, apropriaram-se dos poderes públicos.

Concílio de Tours, realizado no fim do reinado de Carlos Magno, constata que: "Por diversos motivos, em diversos locais os bens dos pobres, quer dizer, os bens daqueles que são conhecidos por homens livres mas que vivem sob a autoridade de poderosos magnatas, ficaram muito reduzidos". Eis os grandes, eclesiásticos e laicos, tornando-se mais e mais os novos senhores.


O Olavo não percebe que a relação de vassalagem entre colonos e donos de terras é a "solução" da questão dos sem-terra de então e que representa a perda do status de cidadão romano, com os direitos que isso acarretava, para uma situação de "dependência dinâmica" com os donos de terra, que significa, nas palavras de le Goff, uma relação de quase escravidão. 

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