Que a Operação Lava Jato teve como inspiração a Mãos Limpas italiana é um fato bem conhecido.
Para que não restem dúvidas, a Folha de São Paulo demonstrou isso através de um paralelo entre as ações da Lava Jato e a descrição da Mãos Limpas feita pelo juiz Sérgio Moro, então um ilustre desconhecido, em um artigo publicado ainda em 2004.
O próprio Serio Moro comparou as operações em uma palestra para procuradores em 2015. Conforme relato da Revista Exame, aliás, "Moro lamentou que algumas oportunidades foram perdidas na Itália, citando como exemplo uma lei que anistiou alguns corruptos", mas que, em suas palavras, "não necessariamente devem ser perdidas aqui no Brasil".
Isso não impediu que, três anos depois, ele mesmo relevasse o crime eleitoral de Onyx Lorenzoni, dando-se por satisfeito pelo fato de que "Ele já admitiu e pediu desculpas".
Voltando a 2015, na breve sabatina após a palestra:
Ao falar do bilionário e ex-primeiro ministro italiano Silvio Berlusconi, que a despeito de todas as evidências de corrupção ficou por três mandatos no poder, antes de renunciar em 2011, Sergio Moro disse não crer que as conquistas já obtidas no Brasil se percam e propiciem que “um aventureiro” assuma o comando do país.
De qualquer forma, em 2018, o juiz Moro aceitou o convite de um outro aventureiro - e candidato beneficiado pela condenação instantânea de Lula, levada a cabo pelo mesmo juiz -, tornando-se seu Ministro da Justiça. E disse tê-lo feito inspirando-se em decisão semelhante tomada pelo coordenador da operação italiana.
Ontem foi publicada, no blog Bem Blogado, uma entrevista com um magistrado que integrou a Operação Mãos Limpas. Ele diz, referindo-se às recentes revelações da Intercept:
Na Itália, caso existissem relações entre o juiz e o Ministério Público que não estivessem dentro da investigação, as críticas sobre essas relações seriam corretas. (…) As violações das regras provocam os efeitos que podem levar nulidade dos atos ou mesmo podem ter efeitos com conseqüências disciplinares. Ou seja, a violação das regras provoca até efeitos penais.
Bolsomínions e olavettes têm se negado a acreditar nessas revelações.
Mas, já que os paralelos com a operação italiana são inegáveis, como eles reagiriam diante do que o Guru da Vírginia escreveu sobre ela?
Em 2001, Olavo de Carvalho disse que a publicidade em torno da Operação Mãos Limpas na Itália tinha uma finalidade política: desviar a atenção do público para crimes de menor importância para proteger uma vertente política - nesse caso, a esquerda. É o que se lê nesse parágrafo:
Desde que, no começo dos anos 90, o dissidente Vladimir Bukovski trouxe dos Arquivos de Moscou as provas de que praticamente toda a imprensa social-democrática européia tinha sido financiada pela KGB na década anterior — suscitando imediatamente a eclosão da Operação Mãos Limpas, com que uma organizada elite de juízes comunistas desviou a atenção do público para casos de corrupção doméstica.
Em 2006, voltou ao assunto:
Com anos de antecedência, em 1993, expliquei que a “Campanha pela Ética na Política” tinha sido concebida exatamente para isso, que qualquer concessão à versão brasileira da “Operação Mãos Limpas” (ela própria um truque esquerdista sujo) seria apenas cumplicidade suicida com a estratégia mais perversa e astuta já adotada pela esquerda nacional ao longo de toda a sua existência.
Em 2011, disse a mesma coisa, mas com outras palavras:
...Mas sua divulgação, feita na Itália, não vingou: foi bloqueada pela deflagração da “Operação Mãos Limpas”, a qual, mediante eficazes acusações de corrupção menor, logrou as lideranças liberais e conservadoras para que se abstivessem de investigar aquilo que foi certamente o mais vasto empreendimento de compra de consciências em toda a história humana. Ajudando assim os comunistas a escorregar para fora da linha de investigações, a célebre ofensiva moralista da magistratura italiana talvez contivesse em seu nome uma alusão ao sabonete usado em análogas circunstâncias pelo mais escorregadio dos magistrados, o limpíssimo Pôncio Pilatos.
Apesar de querer parecer muito ciente dos interesses por detrás desses grandes movimentos de moralização política, o Olavo gravou um vídeo parabenizando Moro por ter mandado prender... a esquerda.
Parafraseando sua análise sobre a inspiradora Mãos Limpas, ele poderia coerentemente ter dito que a Operação Lava Jato é, ela própria, um truque entreguista sujo através do qual uma organizada elite de juízes, muitos deles treinados pelos americanos, desviou a atenção do público para casos menores de corrupção enquanto ajudava a destruir a economia doméstica e entregá-la nas mãos de terceiros de forma análoga à de uma ligeiríssima empresa americana, constituindo uma espécie de Judge Eats.